Câmara aprova licença menstrual remunerada de até dois dias por mês para trabalhadoras com sintomas graves. O texto segue para o Senado
Saúde ocupacional feminina
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (28) o projeto que institui a licença menstrual. Essa proposta permite que as trabalhadoras se afastem por até dois dias consecutivos por mês devido a sintomas graves e incapacitantes. O texto segue agora para análise e votação no Senado Federal para, então, seguir para a sanção presidencial, caso seja aprovado nas duas Casas. A medida busca reconhecer as dificuldades reais enfrentadas por uma parcela significativa de mulheres durante o ciclo menstrual, cujos sintomas podem ser extremamente debilitantes.
Segundo dados apresentados durante a tramitação do projeto, cerca de 15% das mulheres sofrem com dores e cólicas intensas, as quais chegam a prejudicar profundamente a rotina profissional e pessoal. A relatora do projeto, deputada Professora Marcivania (PCdoB-AP), destacou veementemente que a iniciativa não se trata de um privilégio. Ela afirma, em contrapartida, que é um importante instrumento de equidade e de prevenção em saúde ocupacional, reconhecendo as especificidades do corpo feminino. A proposta reconhece que a presença forçada no trabalho, sob condições dolorosas, pode reduzir drasticamente a produtividade da funcionária.
Além disso, a deputada argumenta que o quadro de dor intensa pode levar ao aumento de erros e até mesmo ao risco de acidentes no ambiente de trabalho, o que não é benéfico para ninguém. O projeto original, da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), havia sugerido inicialmente uma licença um pouco maior, de até três dias consecutivos. A versão aprovada, entretanto, unificou o texto com outras sugestões de comissões temáticas para alcançar o formato final. A legislação trabalhista brasileira, historicamente pensada sob uma lógica masculina que ignorava as particularidades femininas, finalmente ganha uma relevante e necessária contribuição social.
Detalhes do Projeto
O projeto de lei aprovado estabelece critérios claros e bem definidos para a concessão da licença remunerada mensal, buscando a seriedade e o uso adequado do benefício. Para ter direito ao afastamento de até dois dias, a trabalhadora precisará obrigatoriamente apresentar um laudo médico. Este documento deve atestar inequivocamente as condições clínicas debilitantes decorrentes do ciclo menstrual que a impeçam, temporariamente, de exercer suas funções profissionais. A nova regra abrangerá um amplo espectro de trabalhadoras do país, assegurando que diversas categorias sejam contempladas com o benefício.
Estão incluídas as funcionárias do setor privado que possuem carteira assinada, as estagiárias e também as empregadas domésticas. A proposta aprovada altera diretamente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), na parte que trata das faltas consideradas justificadas. A Lei do Estágio também será modificada para assegurar o direito de afastamento às estagiárias, reconhecendo suas necessidades. Por fim, a Lei Complementar 150/15, que rege o contrato de trabalho doméstico, passará por alterações significativas para incluir o novo direito às empregadas. O Poder Executivo federal ficará responsável por estabelecer o prazo de validade do laudo médico a ser apresentado pelas trabalhadoras.
Também caberá ao governo definir a forma de apresentação e a periodicidade de sua renovação, considerando as particularidades de cada atividade. Isso será feito considerando as peculiaridades das atividades profissionais desempenhadas pela mulher e as condições específicas de seu quadro médico. A medida visa assegurar, de maneira eficaz e justa, a igualdade de gênero e a saúde ocupacional das trabalhadoras em todo o território nacional.
Contexto global e a Importância da discussão no Brasil
O debate sobre a licença menstrual não é uma novidade recente, sendo, na verdade, um tema discutido globalmente há muitas décadas em diversas culturas. No cenário internacional, países como Japão, Coreia do Sul e Indonésia já possuem legislações semelhantes há um considerável tempo, demonstrando uma preocupação social anterior. Mais recentemente, a Espanha se tornou, em fevereiro de 2023, o primeiro país da Europa a aprovar uma lei nacional sobre o tema.
Em alguns lugares, como no Japão, a lei existe desde 1947, embora o uso da licença ainda enfrente estigmas sociais e taxas de adesão relativamente baixas. A Zâmbia também se destacou, sendo pioneira na África ao adotar a política em 2015, onde o benefício é conhecido popularmente como “Mother’s Day”. O modelo de aplicação varia consideravelmente de um país para outro, indo desde a estrita exigência de atestado médico até sistemas baseados mais na confiança e autodeclaração. A implementação da licença em empresas de grande porte ao redor do mundo, como a Nike e a empresa de entregas Zomato na Índia, tem mostrado resultados corporativos positivos.
Há relatos consistentes de melhorias no bem-estar das colaboradoras e, em alguns casos, até ganhos de produtividade e retenção de talentos. O avanço do projeto na Câmara brasileira sinaliza uma importante modernização da nossa legislação trabalhista, que estava atrasada nesse quesito. Ele coloca o país em alinhamento com práticas internacionais que visam maior inclusão, respeito e humanização no ambiente de trabalho. A aprovação final no Senado e a subsequente sanção presidencial consolidarão um passo fundamental para o reconhecimento e proteção da saúde feminina no Brasil.







